CNJ decide por voto aberto na promoção de magistrados
Brasília, 30/08/2005 - Por maioria dos votos, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) entendeu que a promoção de magistrados por merecimento deverá ser decidida por voto aberto, fundamentado e realizado em sessão pública, observados os critérios objetivos definidos pela Constituição Federal (art. 93, II, c, modificado pela Emenda Constitucional EC 45/04).
Esse entendimento foi firmado durante a análise de requerimento encaminhado pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), que pediu a auto-aplicabilidade dos incisos II, VIII "a" e X do artigo 93 da CF, bem como votação nominal, aberta e motivada para a promoção de juízes.
Em sessão anterior, após o voto do relator, conselheiro Oscar Argollo, favorável ao pedido da associação, o julgamento foi interrompido por um pedido de vista do conselheiro Alexandre de Moraes. Hoje (30/8), a matéria foi submetida novamente à apreciação do conselho.
"Entendo ser absolutamente necessária a fixação de regras objetivas para rigorosa observância dos requisitos constitucionais para a promoção e remoção por merecimento de magistrado, pelo voto nominal, aberto e fundamentado", disse Alexandre de Moraes em seu voto-vista. O conselheiro propôs ainda a edição de uma resolução, produzida pelo CNJ, sobre indicações para promoção por merecimento de magistrado.
Os conselheiros Vantuil Abdala e Marcus Faver divergiram. Para eles, não deve haver mudança no sistema de promoção de juízes que, atualmente, ocorre por meio de voto secreto e sem motivação. "É a votação aberta que leva ao desvio, é essa que é mais sujeita à pressão", afirmou Abdala, que se mostrou contrário também quanto à motivação do voto, pois, segundo ele, para haver fundamentação os magistrados teriam que ser comparados.
Faver ressaltou que o sigilo de voto é uma garantia constitucional dos eleitores em geral, e que essa garantia possibilita ao eleitor "repelir e resistir às investidas, insinuações e pedidos que lhe chegam". O conselheiro concluiu que se o sigilo do eleitor for quebrado "quebra-se também sua independência".
Por fim, o conselho entendeu ser necessária a edição de resolução a ser realizada futuramente, definindo-se os critérios a serem adotados pelos tribunais.
Nepotismo
A votação de dois casos envolvendo a proibição de nepotismo no âmbito do Judiciário foi retirada de pauta, devendo ser ocorrer nas próximas sessões.
A seguir, as íntegras do relatório do conselheiro representante da OAB, Oscar Argollo:
RELATÓRIO
Conselheiro Oscar Argollo (Relator):
A ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS–AMB, por seu Excelentíssimo Presidente, requer “pedido de expedição de recomendação de providências para todos os Tribunais nacionais” (sic), visando à observância do “voto aberto e fundamentado nas promoções por merecimento” (sic) e, bem assim, a “observância dos novos critérios objetivos” (sic), dispostos na Constituição Federal, além dos contidos na Lei Complementar no. 35/79, a LOMAN.
Fundamenta a pretensão em novos dispositivos constitucionais advindos da Emenda Constitucional no. 45/2004, especialmente na alínea “c” do inciso I do artigo 93 da Carta Magna. Alude que “é preciso que cada Tribunal discipline, pelo menos, (a) quais as condutas do juiz que haveriam de ser consideradas para contribuir ou para prejudicar a aferição do merecimento, (b) quais os parâmetros para o fim de poder ser quantificada a operosidade no exercício do cargo, e (d) qual a valoração atribuída para cada curso de aperfeiçoamento. Por razões que a AMB desconhece ou mesmo por inércia, a prática revela que os Tribunais jamais observaram esses critérios, tanto assim que as promoções por merecimento sempre se dão por meio de mera votação secreta, pelo Tribunal, dentro os integrante de uma lista” (sic). Ademais disso, invoca o inciso X do artigo 93, da Constituição Federal, e o inciso II do parágrafo 1o do artigo 80, da Lei Complementar no. 35/79, a LOMAN.
É o Relatório.
VOTO
Conselheiro Oscar Argollo (Relator):
“O problema do fundamento de um direito apresenta-se diferentemente conforme se trate de buscar o fundamento de um direito que se tem ou de um direito que se gostaria de ter. No primeiro caso, investigo no ordenamento jurídico positivo, do qual faço parte como titular de direitos e de deveres, se há uma norma válida que o reconheça e qual é essa norma; no segundo caso, tentarei buscar boas razões para defender a legitimidade do direito em questão e para convencer o maior número de pessoas (sobrevindo as que detêm o poder direto ou indireto de produzir normas válidas naquele ordenamento) a reconhecê-lo. (Norberto Bobbio, A Era dos Direitos, 1992, Ed. Campus)
O inciso I do parágrafo 4o do artigo 103-B da Constituição Federal outorgou ao Egrégio Conselho Nacional de Justiça competência para “zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências”. Sendo assim, diante da pretensão exposta pela AMB entendo, data maxima venia, ser competência do Egrégio CNJ expedir Recomendação aos Colendos Tribunais nacionais acerca da matéria em tela, especialmente porque ainda vigente a Lei Complementar no. 35/79, a LOMAN, e face à inexistência do Estatuto da Magistratura, ora em face de elaboração por parte do Excelso Pretório.
Impõe-se, desde logo, dizer que a observância de norma jurídica é ato imperativo no âmbito do Poder Judiciário. Observar, sobretudo, norma constitucional ou legal é dever da Magistratura. Desta forma, o disposto no inciso X do artigo 93 da Constituição Federal, agora representado pela Emenda Constitucional no. 45/2004, contém caráter imperativo e com eficácia imediata, no sentido de que “as decisões administrativas dos tribunais serão motivadas e em sessão pública, sendo as disciplinares tomadas pelo voto da maioria absoluta de seus membros”. Por assim ver, a incidência imediata da norma constitucional constitui princípio inarredável e as matérias administrativas dos Tribunais devem ser articuladas de forma pública e motivadas com fundamentos que permitam identificar o conteúdo das respectivas manifestações ou decisões.
No que tange à matéria dos autos, ab initio merece cotejo o texto constitucional, das alíneas constantes no inciso II do artigo 93, com o disposto no inciso II do artigo 80 da Lei Complementar no. 35/79.
A Constituição Federal determina que:
Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:
...
II - promoção de entrância para entrância, alternadamente, por antigüidade e merecimento, atendidas as seguintes normas:
a) é obrigatória a promoção do juiz que figure por três vezes consecutivas ou cinco alternadas em lista de merecimento;
b) a promoção por merecimento pressupõe dois anos de exercício na respectiva entrância e integrar o juiz a primeira quinta parte da lista de antigüidade desta, salvo se não houver com tais requisitos quem aceite o lugar vago;
c) aferição do merecimento conforme o desempenho e pelos critérios objetivos de produtividade e presteza no exercício da jurisdição e pela freqüência e aproveitamento em cursos oficiais ou reconhecidos de aperfeiçoamento;
d) na apuração de antigüidade, o tribunal somente poderá recusar o juiz mais antigo pelo voto fundamentado de dois terços de seus membros, conforme procedimento próprio, e assegurada ampla defesa, repetindo-se a votação até fixar-se a indicação;
e) não será promovido o juiz que, injustificadamente, retiver autos em seu poder além do prazo legal, não podendo devolvê-los ao cartório sem o devido despacho ou decisão;
Por sua vez, a LOMAN dispõe:
Art. 80. A lei regulará de promoção, preservando a observância dos critérios de antigüidade e de merecimento, alternadamente, e o da indicação dos candidatos à promoção por merecimento, em lista tríplice, sempre que possível....
II - para efeito da composição da lista tríplice, o merecimento será apurado na entrância e aferido com prevalência de critérios de ordem objetiva, na forma do regulamento baixado pelo Tribunal de Justiça, tendo-se em conta a conduta do juiz, sua operosidade no exercício do cargo, número de vezes que tenha afigurado na lista, tanto para entrância a prover, como para as anteriores, bem como o aproveitamento em cursos de aperfeiçoamento;
Com efeito, ao se realizar o cotejo entre os textos acima transcritos é possível afirmar que para efeitos de promoção de Juiz, por merecimento, há critérios semelhantes dispostos tanto na Constituição Federal como na LOMAN, v.g.: a conduta do juiz, a operosidade e a freqüência em lista e, como também, o aproveitamento em cursos de aperfeiçoamento. Basicamente, a Emenda Constitucional no. 45/2004, ainda que tenha alterado a redação do texto revogado, no particular e em seu conteúdo, nada mudou.
Na verdade, tenho que a pretensão da AMB não é buscar, perante o CNJ, os reais critérios objetivos para a promoção por merecimento, que a LOMAN remete para normas internas de cada Tribunal, e que o Excelso Pretório, de alguma forma, haverá de dispor no futuro Estatuto da Magistratura. Quer sim, a AMB, uma Recomendação do CNJ no sentido de que a votação de lista de Juizes candidatos à promoção por merecimento se realize de maneira aberta, extinguindo a figura do voto secreto em tal situação, procedimento que é disposto em algumas normas jurídicas estaduais ou internas de Tribunais.
Inicialmente, convém dizer que tenho firmes convicções sobre a utilização do instituto do voto secreto, mas não de maneira genérica. Aliás, em Palestra proferida durante o 8º Ciclo Internacional de Conferências organizado pela AMATRA XXIII – Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 23ª Região, em 17.08.2001, na cidade de Cuiabá, pude externar pensamento sob o título “O Voto Secreto: Um instituto à beira da morte”, quando reafirmei entendimento sobre a mantença do voto secreto em determinadas situações, concluindo que: “é possível afirmar que há possibilidade de ocorrer a extinção do voto secreto no Brasil, tendo em vista a maneira como vem sendo tratado tal instituto. Mesmo que algumas escolhas, diversas do sufrágio universal, aconteçam em âmbitos diferentes do processo eleitoral político-partidário nacional, é impossível dissociar um mesmo pensamento de outros modelos de votação. A supressão do voto secreto, indistintamente, por parte de diversas Assembléias e Câmaras nacionais, atenta contra direitos individuais do cidadão parlamentar, expondo-o ao poder governante, submetendo-o a constrangimentos pessoais e políticos e, favor de seus eleitores. A preservação da intimidade e da privacidade é elemento essencial aos princípios de liberdade e independência do cidadão, razão pela qual é demagógica, indecorosa e completamente descabida, por ser cláusula petrea constitucional, a extinção geral do voto secreto no Brasil”.
Tal conclusão foi extraída do exame histórico da figura do voto secreto, desde Roma e Grécia, passando pela Idade Média européia, especialmente através da Península Ibérica, de onde surgem nossas tradições; e verificando disposições das Ordenações do Reino que vigiam no Brasil Colônia. Também durante o Brasil independente: seja na Monarquia, com a Constituição Imperial (1824); a Lei dos Círculos (Decreto no. 842, de 06.09.1853); a Lei do Terço (Decreto no. 2675, de 20.10.1875); e a Lei Saraiva (09.01.1881); seja na República, com Júlio de Castilhos e sua Constituição do Rio Grande do Sul (14.07.1891); a primeira legislação eleitoral brasileira (Lei Federal no. 35, de 26.01.1892); a Lei Rosa e Silva (Lei Federal no. 1269, de 15.11.1904); os Códigos Eleitorais de 1932 e de 1965; e a Lei Orgânica dos Partidos Políticos (Lei no. 5682, de 21.07.1971).
Ademais disso, é possível verificar que a partir dos pensamentos de Montesquieu e Robespierre pode transparecer a idéia de que todo sufrágio deve ser público e aberto. Acontece, na verdade, que na natureza do voto secreto há circunstâncias imperiosas de intimidade e privacidade, que não permite divagações, colocações casuísticas ou fisiológicas, especialmente na apreciação e interpretação teleológica da regra considerada moralmente ética, caracterizada como sendo imperativa e de ordem geral, hipótese que não permite individualismos.
Naquela manifestação realizada em Cuiabá, disse ainda que “não há dúvida quanto à possibilidade de certas votações se processarem através do voto declarado em escrutínio público, sem observância de qualquer sigilo. Todavia, há situações, em qualquer esfera de eleição, que o escrutínio e o voto devem ser secretos, especialmente quando tais pleitos são efetuados para a escolha de pessoas, ou para julgar sobre o comportamento das mesmas, pois em tais circunstâncias se faz presente, imperiosamente, as condições de intimidade e privacidade de todos os partícipes da mesma escolha”. E, justifiquei: “A influência política forte do poder governante e a situação de devassamento da intimidade e da privacidade das pessoas, diante do poder social e político que tais poderes exercem em determinadas localidades ou ocasiões, impõem a figura do sigilo pleno, absoluto, em determinados escrutínios, sob pena de submeter o votante a eventuais constrangimentos”.
Ora, convém dizer que tais posições foram apresentadas com o pensamento dirigido para as votações político-partidárias e voltado para o constrangimento que o votante, sem qualquer poder, pode sofrer diante daquele ou daqueles que detém o poder. Mas, in casu, na escolha de Juiz, quando de promoção por merecimento, verifica-se que o votante é um Magistrado de nível superior ao votado e, na verdade, é aquele que detém o poder, ao passo que o votado é figura menor, hierarquicamente assim considerado, sujeito a um processo de escolha que, basicamente, deve ter por objeto, simplesmente, o exame do merecimento em razão de performance profissional. Urge dizer, então, que não se trata de violar pensamento sobre a utilização do voto secreto, mas sim distinguir a situação em tela, como excludente da possibilidade de aplicação do voto secreto.
Como já mencionado acima, ao cotejar os termos da Constituição Federal com os ainda vigentes na LOMAN, no que tange aos critérios objetivos para a promoção por merecimento de Magistrado, nada mudou nem alterou o sistema atual, até porque, ainda que a norma constitucional indique critérios objetivos, idênticos aos presentes na LOMAN, a depuração de tais critérios, data venia, enseja verificações subjetivas.
Amiúde, na estrutura do Poder Judiciário, a questão da promoção de Magistrado, por merecimento, convive com a subjetividade, possibilitando interesses pessoais, barganhas políticas, bajulações e conformismos com as determinações dos superiores hierárquicos. Isso tanto é verdade que a maioria da comunidade envolvida pugna pela adoção do voto aberto nas sessões públicas. A propósito, a incidência, com eficácia imediata, do disposto no artigo 93 da Constituição Federal não admite mais qualquer sessão administrativa que não seja pública, uma vez que o inciso X determina que “as decisões administrativas dos tribunais serão motivadas e em sessão pública”, salvo nos julgamentos “em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação”, conforme o inciso IX do mesmo dispositivo constitucional, que está em harmonia com o inciso LX, do artigo 5º, da Carta Magna, inserido no capítulo "Dos Direitos e Garantias Individuais e Coletivos", prevendo que "a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem”.
Desde logo, pois, é possível afirmar que as sessões dos Tribunais destinadas à promoção de Magistrado, por merecimento, devem ser públicas, sob pena de violação de preceito constitucional. Deviam ser públicas mesmo antes da Emenda Constitucional no. 45/2004. Aliás, o Supremo Tribunal Federal já se manifestou a respeito ao analisar Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.700, proposta contra a Emenda Constitucional nº 28, que alterou a Constituição do Estado do Rio de Janeiro, para estabelecer regras para o cumprimento do artigo 93, IX, da Constituição Federal, cuja Ementa é a seguinte:
DIREITO CONSTITUCIONAL - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 28, DE 25 DE JUNHO DE 2002, DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, QUE DEU NOVA REDAÇÃO AO ART. 156 DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL, ESTABELECENDO NORMAS SOBRE FORMA DE VOTAÇÃO NA RECUSA DE PROMOÇÃO DO JUIZ MAIS ANTIGO, PROVIDÊNCIAS A SEREM TOMADAS, APÓS A RECUSA, PUBLICIDADE DAS SESSÕES ADMINISTRATIVAS DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, MOTIVAÇÃO DOS VOTOS NELES PROFERIDOS, E PUBLICAÇÃO DO INTEIRO TEOR NO ÓRGÃO OFICIAL DE IMPRENSA. ALEGAÇÃO DE QUE A NOVA REDAÇÃO IMPLICA VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 93, CAPUT, E INCISOS II, "d", E X, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, CONFLITANDO, AINDA, COM NORMAS, POR ESTA RECEBIDAS, DA LEI ORGÂNICA DA MAGISTRATURA NACIONAL - MEDIDA CAUTELAR.
1. Em face da orientação seguida, pelo STF, na elaboração do Projeto de Estatuto da Magistratura Nacional e em vários precedentes jurisdicionais, quando admitiu que a matéria fosse tratada, conforme o âmbito de incidência, em Lei de Organização Judiciária e em Regimento Interno de Tribunais, é de se concluir que não aceita, sob o aspecto formal, a interferência da Constituição Estadual em questões como as tratadas nas normas impugnadas. 2. A não ser assim, estará escancarada a possibilidade de o Poder Judiciário não ser considerado como de âmbito nacional, assim como a Magistratura que o integra, em detrimento do que visado pela Constituição Federal. Tudo em face da grande disparidade que poderá resultar de textos aprovados nas muitas unidades da Federação. 3. Se, em alguns Estados e Tribunais, não houverem sido implantadas ou acatadas, em Leis de Organização Judiciária ou em Regimentos Internos, normas auto-aplicáveis da Constituição Federal, como as que regulam a motivação das decisões administrativas, inclusive disciplinares, e, por isso mesmo, o caráter não secreto da respectiva votação, caberá aos eventuais prejudicados a via própria do controle difuso de constitucionalidade ou de legalidade. 4. E nem se exclui, de pronto, a possibilidade de Ações Diretas de Inconstitucionalidade por omissão. 5. Medida Cautelar deferida, para se suspender a eficácia da Emenda Constitucional nº 28, de 25 de junho de 2002, do Estado do Rio de Janeiro." (Votação: por maioria, vencidos os Min. Sepúlveda Pertence e Marco Aurélio. Resultado: deferida a medida cautelar, para suspender a eficácia do art. 156 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, com a redação dada pela Emenda Constitucional Estadual nº 28, de 25.06.2002". Acórdãos citados: ADI-509-MC, ADI-1152-MC, ADI-1422-MC, ADI-189 (RTJ-132/66), MS-21769, MS-22432. N.PP.:(48). Análise:(JBM). Revisão:(RCO). Inclusão: 15/12/03, (SVF). Alteração: 11/02/04, (SVF).(grifo nosso)
Não há dúvida, portanto, que o Excelso Pretório, como guardião da Constituição Federal e com tal decisium, reafirmou preceito contido no caput do artigo 37, destinado à Administração Pública, uma vez que “A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência...".
Ainda que os critérios objetivos para a promoção de Magistrado, por merecimento, previstos na Constituição Federal indiquem a aferição pelo desempenho, produtividade, presteza no exercício da jurisdição, freqüência e aproveitamento em cursos de aperfeiçoamento, oficiais ou reconhecidos, parece, data venia, haver certa dificuldade na valoração de tais condições, haja vista as diferenças, inclusive regionais, existentes no país, a criarem visíveis distinções pela diversidade de foros, de populações, de culturas e de questões apresentadas pelos jurisdicionados. Na promoção de Magistrado, por merecimento, data maxima venia, caberá aferição e aprovação a quem tiver uma produtividade positiva seja no campo individual, seja na área institucional.
No campo individual há situações, a despeito das diversas organizações administrativas dos diversos Tribunais brasileiros, que indicam valores para a aferição do desempenho, da produtividade, da presteza no exercício da jurisdição e da freqüência do Magistrado, apontando cinco situações: a) a existência de Juízes que não trabalham; b) Juízes que trabalham muito, mas produzem pouco; c) Juízes que trabalham muito e produzem muito; d) Juízes que desperdiçam tempo e entregam a prestação jurisdicional em escala insuficiente; e, e)Juízes que trabalham nos limites de suas capacidades, mas não conseguem absorver o volume dos serviços.
Na dimensão individual há, portanto, fatores que refletem nas atitudes e comportamentos fundamentais de cada um para o desempenho das tarefas e atividades funcionais, que somente podem ser qualificadas e quantificadas através de valoração a ser determinada pelos próprios Tribunais, pelas condições sob as quais o trabalho é desenvolvido. Deixar a cargo dos Tribunais tal valoração é a situação mais adequada, eis que somente cada Tribunal, dentro de suas peculiaridades, poderá determinar a pontuação de cada uma das metas, projetos, trabalho em equipe, tarefas ou atividades envolvidas, algumas delas de fácil apuração, v.g.: a freqüência.
No âmbito institucional, o merecimento de cada Magistrado deverá ser apurado de acordo com a competência profissional e a eficiência no exercício da função, diante do aprimoramento da cultura jurídica, situações demonstradas por certificados ou diplomas de conclusão de cursos relacionados com as atividades pertinentes. Tais condições também somente podem ser valoradas pelos respectivos Tribunais, face – como já mencionado - às peculiaridades de cada região.
Parece, então, que diante de tais circunstâncias, ousaria “recomendar” a AMB que realize um trabalho abrangente e completo a respeito da matéria, no sentido de ofertar, de lege ferenda, ao Excelso Pretório a indicação de condições bem objetivas acerca das situações antes enfocadas e, quiçá, outras que sejam pertinentes, para que venham constar do futuro Estatuto da Magistratura, deixando a cargo de cada Tribunal a valoração de cada uma das hipóteses caracterizadas, et pour cause. Assim, modelos objetivos e valorados de aferição permitirão a identificação clara e imediata daquele que vencerá a escolha. Se, porventura, ocorrer empate, decerto a idade poderá ser o critério de solução, como sufragou o Supremo Tribunal Federal no julgamento do Mandado de Segurança que impugnou lista de Desembargadores do Tribunal Regional Federal da 3a. Região, cuja Ementa é a seguinte (STF, 24.509/DF, Rel: Min. Sepúlveda Pertence):
EMENTA: I. Mandado de Segurança - Legitimação ativa - Composição de lista para a promoção por merecimento de juízes aos tribunais. No procedimento de promoção de magistrados, todos os concorrentes à lista e nela não incluídos estão legitimados, em princípio, para questionar em juízo a validade da sua composição, se, do reconhecimento da nulidade argüida, possa decorrer a renovação do ato de escolha, que estariam qualificados para disputar. II. Justiça Federal - Lista de promoção por merecimento de juízes ao Tribunal Regional Federal - Desempate em favor do mais idoso, conforme norma regimental - Validade. Não ofende a Constituição a norma regimental de TRF de que, após sucessivos empates na composição da lista de juízes para a promoção por merecimento, prescreve o desempate em favor do mais idoso.
Não se trata - ao contrário dos precedentes do STF, que o rejeitaram, da adoção do critério objetivo de antigüidade para desempate na promoção por merecimento - mas, sim, de um dado subjetivo dos candidatos, a idade, que se reputou - sem ofensa ao princípio da razoabilidade - se devesse seguir à avaliação dos méritos dos candidatos, reputados equivalentes pela votação idêntica obtida, em sucessivos escrutínios.(grifo nosso)
No julgamento do aludido Mandado de Segurança. o Exmo. Sr. Ministro Nelson Jobim chamou a atenção para o problema decorrente da votação secreta, concluindo que os critérios objetivos somente poderiam ser objeto de consideração em voto aberto. Disse, então, Sua Excelência:
“O Tribunal já fixou, por diversas decisões antes referidas, e rejeitou a antiguidade na entrância como critério de desempate por merecimento, ou seja, temos uma regra, pelo menos assente ao Tribunal, que determina condutas aos outros tribunais, porque já tem uma notícia em outros casos de que há uma regra: não se permite a promiscuidade entre os dois critérios. Ou seja, o Tribunal fixou o desempate por merecimento, não pode ser utilizado o critério da antiguidade na entrância. Essas foram as decisões estabelecidas na ADI n. 189, do Ministro Celso de Mello, uma decisão já relativamente antiga de 1992, e, depois, uma decisão também do Ministro Carlos Velloso, na ADI n. 654, também de 1993. Portanto, temos uma orientação e já passaram dez anos em relação a essa posição. Essa é a questão. Não se pode adotar, por determinação nossa em dois casos e outros também, como critério para o desempate no merecimento, o critério da antiguidade da entrância. Abre-se um espaço, qual ? Temos de encontrar uma solução. Não creio, peço vênia ao Ministro Marco Aurélio, que a objetividade real e os cados da realidade com os pés totalmente pisados no chão, que vamos aguardar que os tribunais possam vencer a teimosia. Ou seja, o desempate. Um grande jornalista americano, Lee Manquel, que dizia que os juízes votam de acordo com sua consciência e que a consciência dos juízes leva ao desempate necessário, em um determinado momento da votação. Quero lembrar, com Manquel, que consciência nada mais é do que uma voz interior que nos adverte de que tem alguém olhando. E no caso de votação secreta, o olho não enxerga o que está acontecendo.
Portanto, a operação da consciência ficaria oculta pela votação secreta, que, aliás, como se dizia no parlamento, é um imenso atrativo para traição, exatamente por ser secreta. Creio que a solução dada pelo Tribunal e pelo seu Regimento Interno do TRF/3ª Região, que é exatamente o art. 26, § 16, depois de longamente dispor a respeito do tema, refere que:
“§ 16 – em caso de empate, em mais de três escrutínios, o desempate far-se-á pela escolha do candidato mais idoso.”
Não se adotou a regra que proibimos em 1992: o critério da entrância. Por outro lado, tenho dificuldade, Ministro Cezar Peluso, na comparação feita entre a votação por merecimento nos tribunais em relação à votação nas eleições para presidente da República, prefeito municipal, ou para governador de Estado. Na votação por merecimento, que é secreta, na verdade, estaríamos perante algo efetivamente objetivo. Quando diz a Constituição na alínea “c”, inciso II:
“Art. 93 ....
c) aferição do merecimento pelos critérios de presteza e segurança no exercício da jurisdição e pela freqüência e aproveitamento em cursos reconhecidos de aperfeiçoamento.”
Poderia dizer que uma votação secreta tivesse que ser avaliada em ação ordinária para se provar que o resultado da votação não atendeu à presteza e à segurança, e teria uma infindável discussão sobre isso.
(...)
Desde então, tenho uma certa tendência a admitir que a alínea “c” do inciso II, no que diz respeito à pretensão de atrelar o voto por merecimento a critério objetivos, nada mais seja do que uma retórica, porque senão seria voto não secreto, mas aberto.” (grifo nosso)
Se a dificuldade de aferição dos critérios objetivos estava na votação secreta, adotada de forma inconstitucional por diversos Tribunais, agora, após a Emenda Constitucional no. 45/2004, não existe mais essa dificuldade. Não podem subsistir, nem a votação em sessão secreta, nem o voto fechado, desprovido de fundamentação. Nada justifica, portanto, a subsistência, em normas jurídicas estaduais ou nos Regimentos Internos dos Tribunais, de regra estabelecendo que a votação, para escolha de Magistrado visando à promoção por merecimento, se dê de forma desmotivada e em sessão secreta. Havendo critérios objetivos para apuração do merecimento, bem ainda a obrigação de que as sessões administrativas sejam públicas e motivadas suas decisões, somente com a observância desses requisitos é que as nomeações não estarão viciadas. Somente com base na decisão fundamentada e pública é que poderão os próprios Magistrados exercer o direito subjetivo, de cada qual, de questionar sua eventual recusa, como já decidiu o Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADIN no. 1.303-MC, quando foi Relator o Min. Maurício Corrêa, julgada em 14.12.1995, cuja Ementa é a seguinte:
MEDIDA LIMINAR EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - REGIMENTO INTERNO DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DE SANTA CATARINA, § 2º DO ART. 45 - REDAÇÃO ALTERADA PELA RESOLUÇÃO ADMINISTRATIVA Nº 062/95-TRT/SC - PROMOÇÃO POR ANTIGÜIDADE - JUIZ MAIS ANTIGO - VOTO SECRETO – PRELIMINAR - ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS – AMB - LEGITIMIDADE ATIVA - PERTINÊNCIA TEMÁTICA - DESPACHO CAUTELAR, PROFERIDO NO INÍCIO DAS FÉRIAS FORENSES, AD REFERENDUM DO PLENÁRIO (art. 21, IV e V do RISTF).
1. Preliminar: Esta Corte já sedimentou, em sede de controle normativo abstrato, o entendimento da pertinência temática relativamente à legitimidade da Associação dos Magistrados Brasileiros - AMB, admitindo que sua atividade associativa nacional busca realizar o propósito de aperfeiçoar e defender o funcionamento do Poder Judiciário, não se limitando a matérias de interesse corporativo (ADI nº 1.127-8). 2. Mérito do pedido cautelar: a) competência do tribunal para obstar a promoção do Juiz mais antigo: a única alteração foi referente ao quorum: "2/3 (dois terços) dos seus Membros ", em lugar de "2/3 (dois terços) de seus Juízes vitalícios": nesta parte, a alteração não afronta texto constitucional; b) a Resolução Administrativa que alterou a redação do § 2º do art. 45 do Regimento Interno do TRT/SC manteve o critério da escolha pelo voto secreto; se é certo que a Constituição Federal, em seu art. 93, inciso II, letra "d", faculta a recusa do Juiz mais antigo para a promoção, impondo o quorum de dois terços, também não é menos certo que, em se tratando de um dos tipos de decisão administrativa, venha ela desacompanhada da respectiva motivação, a teor do enunciado do mesmo art. 93, em seu inciso X; c) ao Juiz preterido há de ser assegurado o seu direito constitucional de conhecer as razões da preterição; o que não pode é o Juiz ser recusado sem saber qual o motivo; esse direito é um dogma constitucional que se incorpora ao direito do preterido; d) o texto do § 2º do art. 45 do Regimento Interno do TRT/SC, com a redação data pela Resolução Administrativa nº 062/95, não está integralmente contaminado pelo vício de inconstitucionalidade, mas, tendo em vista a plausibilidade jurídica do pedido, dele há de excluir-se a palavra "secreto". 3. Referendado, em parte, o despacho cautelar, para suspender, até a decisão final da ação, a vigência da palavra "secreto". (grifo nosso)
Não é apenas a preterição, pela maioria qualificada do Tribunal, que deve ser motivada, mas também a escolha dos Magistrados que o Tribunal reputar merecedores da promoção. Mas somente haverá objetividade nas escolhas para fins de promoção, por merecimento, caso os Tribunais previamente definam e disciplinem como os critérios previstos pela Constituição Federal e na LOMAN serão considerados. Isso porque, embora a Constituição Federal e a LOMAN tenham definido os critérios que devem ser considerados, não estabeleceram como tais critérios devem ser considerados ou computados.
Assim, para assegurar a impessoalidade da escolha e até mesmo o seu posterior controle, torna-se imperiosa e urgente prévia regulamentação da regra constitucional pelos próprios Tribunais, oportunidade em que os mesmos deverão estabelecer, de forma clara, o peso e a importância de cada um dos critérios para a aferição geral do merecimento. Importante lembrar que tal solução já podia ser extraída da LOMAN, uma vez que determinava, em seu artigo 80, que os Tribunais baixassem regulamentos com a finalidade de disciplinarem objetivamente os critérios para a promoção por merecimento.
Além de prévia disciplina normativa, data maxima venia, é necessário que os Tribunais, tal como salientou a AMB em seu requerimento, motivem as escolhas dos nomes indicados para a promoção por merecimento, bem como lhes dêem a necessária publicidade, até para o fim de sujeitá-las a todas as formas de controle a que estão submetidos os atos administrativos.
Com efeito, retornando ao cerne da pretensão, relativo ao voto secreto na apuração da promoção de Magistrado, por merecimento, parece necessário expor mais algumas considerações. O exame da Constituição Federal permite identificar hipóteses de aplicação de voto secreto em decisão administrativa do Poder Público, mas somente previsto em casos excepcionais e destinados ao Poder Legislativo, in verbis:
Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:
...
III - aprovar previamente, por voto secreto, após argüição pública, a escolha de:
a) Magistrados, nos casos estabelecidos nesta Constituição;
...
IV - aprovar previamente, por voto secreto, após argüição em sessão secreta, a escolha dos chefes de missão diplomática de caráter permanente;
...
XI - aprovar, por maioria absoluta e por voto secreto, a exoneração, de ofício, do Procurador-Geral da República antes do término de seu mandato;
...
Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:
...
§ 2º - Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.
Quanto ao Poder Judiciário, a Constituição Federal preceitua apenas duas hipóteses para aplicação de voto secreto, a saber:
Art. 119. O Tribunal Superior Eleitoral compor-se-á, no mínimo, de sete membros, escolhidos:
I - mediante eleição, pelo voto secreto:
a) três juízes dentre os Ministros do Supremo Tribunal Federal;
b) dois juízes dentre os Ministros do Superior Tribunal de Justiça;...
Art. 120. Haverá um Tribunal Regional Eleitoral na Capital de cada Estado e no Distrito Federal.
§ 1º - Os Tribunais Regionais Eleitorais compor-se-ão:
I - mediante eleição, pelo voto secreto:
a) de dois juízes dentre os desembargadores do Tribunal de Justiça;
b) de dois juízes, dentre juízes de direito, escolhidos pelo Tribunal de Justiça;
Por derradeiro, urge registrar três observações: a) que o Ministério Público adota o voto aberto quando da escolha por merecimento; b) que no Poder Judiciário, na escolha de Magistrado, para promoção por merecimento, o votante é o detentor do poder, ao passo que o votado é pessoa de nível hierárquico inferior, e quando devem ser observados critérios objetivos de atuação, não existindo, pois, qualquer hipótese para constrangimentos; e, c) que a AMB realizou uma pesquisa, cujo resultado foi apresentado ao processo (fls. ), indicando que os Magistrados são favoráveis à observância do voto aberto e fundamentado no procedimento de escolha para a promoção por merecimento (88,9%) e de utilização de critérios objetivos (95,1%). Vê-se, pois, que a classe dos Magistrados brasileiros anseia, clama e merece a aplicação do voto aberto na escolha de promoção por merecimento.
Assim sendo, considerando os brocardos latinos: ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus (onde a lei não distingue, não pode o intérprete distinguir); verba cum effectu sunt accipienda (não se presumem, na lei, palavras inúteis); e uni lex voluit dixit, ubi noluit, tacuit (quando a lei quis, dispôs, quando não, calou), de rigor concluir que a hermenêutica soluciona a questão e, bem assim, as considerações antes expostas indicam a pertinência da pretensão, tudo através de interpretação lógica e sistemática, no sentido do Egrégio Conselho Nacional de Justiça RECOMENDAR, aos Colendos Tribunais brasileiros, que na hipótese de promoção de Magistrado, por merecimento, devem as respectivas Corregedorias habilitar interessados com dois anos de exercício na respectiva entrância e que integrem a primeira quinta parte da lista de antigüidade, salvo se não houver com tais requisitos quem aceite o lugar vago, oferecendo aos Magistrados votantes os respectivos relatórios de cada inscrito, detalhados e valorados, para o devido exame, tudo sendo realizado em sessão pública de escolha, com votação aberta e fundamentada por parte de cada votante.
É o voto.