EE 5 - ‘Fake news’ e direito ao esquecimento guiam debate sobre liberdade na era digital
São Paulo - Dois dos temas mais relevantes do mundo digital na atualidade - as notícias falsas e o direito ao esquecimento - estiveram presentes no evento especial “Liberdade de Imprensa e de Expressão”, da XXIII Conferência Nacional da Advocacia do Brasil, na tarde desta segunda-feira (27), em São Paulo.
No primeiro painel, os conferencistas debateram as "fake news", em uma mesa mediada por Paulo Tonet Camargo, presidente da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) e composta pelos jornalistas Sérgio Dávila e Manoel Fernandes, mais o advogado Manuel Alceu Affonso Ferreira.
Já o segundo painel, sobre o direito ao esquecimento, contou com a mediação de Marcelo Rech, presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ), e teve como debatedores o editor de livros Carlos Andreazza, o advogado Gustavo Binenbojm e o presidente da Associação Nacional de Editores de Revistas (Aner), Fábio Gallo.
Antídoto às ‘fake news’
Na abertura do primeiro painel do evento especial, Paulo Tonet Camargo enfatizou que o jornalismo profissional já cumpre um papel essencial para enfrentar a falta de credibilidade das notícias falsas divulgadas pela internet, por conta do compromisso com a responsabilidade.
"Nunca o jornalismo profissional, independente e empresarial foi tão relevante para creditar a informação”, afirmou o presidente da Abert, acrescentando que é essencial criar mecanismos de responsabilidade para quem difunde informações mentirosas. "Não é possível que as plataformas tecnológicas de hospedagem digam que não tenham relação com as 'fake news'", completou.
Editor-executivo da Folha de S.Paulo, Sérgio Dávila concorda com Tonet sobre a necessidade de fortalecer o jornalismo profissional como uma ferramenta de enfrentamento às notícias falsas. "O primeiro antídoto contra as 'fake news', a curto prazo, é o jornalismo profissional, aquele que segue uma série de posições e posturas éticas e comportamentos, além de critérios técnicos”, explicou. No entanto, o jornalista ressalva que essa medida é apenas transitória. "O outro antídoto, esse a longo prazo, é a alfabetização digital, de ensinar nossas novas gerações a navegar pela internet", destacou.
Fundador e sócio da Bites Consultoria, Manoel Fernandes afirma ser impossível acabar com a profusão de notícias falsas via Internet, citando um estudo internacional que prevê, até o ano de 2020, mais produção de conteúdos falsos do que verdadeiros. "Quem vai nos ajudar a enfrentar isso são os órgãos de imprensa, em um grande consórcio, porque nenhuma empresa de mídia sozinha conseguirá enfrentar isso."
O analista de dados também frisa a necessidade de que os meios tradicionais invistam em ferramentas tecnológicas, que são, em grande parte, o segredo do sucesso da propagação de notícias inventadas. "Se não usarmos as mesmas técnicas, vamos ficar um passo atrás, já que para produzir um fake news é muito fácil: basta ter uma conexão de Internet”, frisou.
Já Manuel Alceu Affonso Ferreira acredita que o combate às informações falsas é dificultado por, segundo ele, uma própria "inclinação humana de sentir mais atração por uma notícia mentirosa do que uma correta". O advogado sugere como um "caminho jurídico" a criação de uma comissão formada por "todos os defensores do jornalismo profissional", destinada a analisar profundamente o fenômeno. "A partir desse estudo, seria possível encaminhar um projeto de lei contra a fake news”, previu
Direito à informação pública
Na mediação da mesa do segundo painel do evento especial Liberdade de Imprensa e de Expressão, o jornalista Marcelo Rech abriu a fala salientando que a questão do direito ao esquecimento na era da Internet é recente, mas de "primeira grandeza na Europa e nos Estados Unidos", e que se ampara em duas visões: uma primeira que preza pelo direito à privacidade e outra que reivindica o direito à liberdade de informação.
O presidente da ANJ defende incondicionalmente o segundo ponto, embora resguarde ser fundamental a existência de uma distinção entre as esferas pública e privada. "A imprensa responsável faz o direito à atualização quando o assunto é de interesse público”, afirmou.
Carlos Andreazza também defende o princípio de publicar aquilo que "for matéria de interesse público." "Como editor, é a vida pública que me interessa, e não a privada. Tenho desinteresse pela vida privada de uma pessoa até mesmo como forma de protegê-la." O editor de livros e colunista enfatizou que é preciso impedir qualquer proibição à publicação de informações que sejam apuradas com responsabilidade. "Se prosperar essa pauta do 'direito ao esquecimento', o que teremos a longo prazo é a impossibilidade de se contar uma história”, alertou.
O advogado Gustavo Binenbojm é outro defensor de que a sociedade tenha o direito de conhecer a informação "licitamente apurada", mesmo que coloque alguém em uma "situação desabonadora". "Só há uma maturidade de nação quando todos nós possamos defender a liberdade de expressão, ainda que ela possa ser usada contra nós", manifestou. Caso prevaleça o entendimento favorável ao direito ao esquecimento no STF, vai se criar uma estado mais autoritário, "que vai definir o que deve ou não deve estar publicado”.
Atual presidente da Aner, Fábio Gallo disse que deve prevalecer o bom senso na questão do direito ao esquecimento. "Não se pode anular uma informação, mas o cidadão tem o direito de ter as informações atualizadas." Ele acrescenta: "qualquer retirada de conteúdo fere a liberdade de expressão e incentiva a censura”.