Inocentado pela OAB de pecha de delator, Simonal faria 67 anos

sábado, 25 de fevereiro de 2006 às 08:00

Brasília, 25/02/2006 - Acusado de delator durante o regime militar e trinta anos depois absolvido da acusação pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o cantor Wilson Simonal, se estivesse vivo, completaria amanhã (26) 67 anos de idade. A Comissão Nacional de Direitos Humanos (CNDH) da Ordem dos Advogados do Brasil examinou documentos do antigo Serviço Nacional de Informações e da Polícia Federal, registrados na época do regime militar, depoimentos de pessoas que conviveram com Simonal e amplo material jornalístico do começo dos anos 70 para afirmar que não procedia a pecha de “dedo-duro” que foi colada ao cantor.

Wilson Simonal foi acusado em 1972 de tomar participação em um seqüestro e de ter delatado aos órgãos repressores do governo militar uma série de pessoas ligadas ao meio musical. Mesmo tendo negado tudo e sem ter sido julgado pelos supostos crimes, Simonal viu sua carreira decair a partir do incidente. Com a declaração de inocência, a Comissão da OAB considera desagravada a memória de Simonal, que foi julgado sem que pesasse contra ele uma acusação formal e sem ter tido direito à defesa. Pior, foi condenado pela opinião pública sem evidências que comprovassem as acusações. Simonal nasceu no dia 26 de fevereiro de 1939.

O processo no âmbito da OAB foi iniciado em janeiro de 2002, quando amigos e familiares pediram providências para a reabilitação moral de Wilson Simonal. "A Comissão não é um tribunal para decidir sobre a questão formulada, mas proferiu sua conclusão baseada na força moral da OAB, entidade à qual se vincula", explicou o então conselheiro federal Rogério Portanova (SC). O relator da matéria no âmbito da Comissão Nacional de Direitos Humanos da OAB foi o advogado Antônio Ribeiro Romanelli.

Durante as reuniões da Comissão da OAB, Romanelli explicou que a primeira preocupação foi obter o maior número possível de informações. Com base em farto material de vídeo e jornais enviados pela família, elaborou-se uma lista com dezenas de nomes de pessoas que teriam algo a falar sobre o caso. Foram enviadas mais de cem cartas, mas, inicialmente, houve resposta apenas do jornalista Everaldo Lopes e de João Bastos Santana (requerente inicial do processo). A Comissão entendeu que precisava de mais manifestações e enviou uma nova remessa de cartas. Responderam os seguintes artistas: Chico Anysio, Miele, Ronnie Von, o produtor musical Cláudio Manoel Mascarenhas Pimentel e Jair Rodrigues.

"Só podia acusar Wilson Simonal de ter sido delator do SNI quem não o conhecia", escreveu Chico Anysio. "Eu até admito que, por absoluta ignorância política, Simonal aceitasse vir a ser o diretor-geral do SNI, mas ser um dedo duro, quem o conheceu sabe que ele jamais aceitaria ser". Para o comediante, Simonal "incomodava a uns tantos, que não suportavam ver aquele negro com a fita na cabeça, um swing absoluto, um ar de modéstia e ainda cantando olhando nos olhos das moças que brigavam por um lugar nas primeiras filas exatamente para serem olhadas por ele".

Simonal começou cantando calipsos e rocks em inglês. De baile em baile, foi descoberto pelo compositor Carlos Imperial, que o levou para o seu programa de TV, Os Brotos Comandam. Seu primeiro compacto foi o chá-chá-chá Teresinha, de Imperial. De boate em boate, foi parar no templo da bossa nova, o Beco das Garrafas, levado por Luiz Carlos Miéle e Ronaldo Bôscoli. Em 1963, Simonal lançou seu primeiro LP, que estourou a música Balanço Zona Sul, de Tito Madi. Depois de excursionar com o Bossa Três pelas Américas do Sul e Central, lançou o LP A Nova Dimensão do Samba, de bossa nova (destaque para Nanã e Lobo Bobo).

Em 1966 e 1967, apresentou na TV Record o show em Si Monal. A melhor fase de sua carreira chegaria em seguida, com uma série de sucessos dançantes como “País Tropical”, “Mamãe Passou Açúcar em Mim”, “Meu Limão, Meu Limoeiro” e “Sá Marina”, que deram origem a um estilo suingado conhecido como pilantragem. Tal era a popularidade que Simonal chegou a reger um coro de 15 mil vozes no show de encerramento do IV Festival Internacional da Canção, no Maracanãzinho.

Filho de uma lavadeira, nasceu no subúrbio carioca de Água Santa. O nome Simonal deriva de uma homenagem a um médico de sobrenome Simonard, que ajudou a manter a família. No momento do registro, o tabelião escreveu erradamente Simonal. O cantor faleceu na manhã de 25 de junho de 2000, devido à falência das funções hepáticas. Em seus últimos anos conseguira ensaiar um tímido retorno aos meios de comunicação, mas a saúde debilitada o impediu de apagar definitivamente a pecha de informante do regime militar, a qual Simonal negou até o final da vida.

Inquestionável é o fato de que um intérprete de primeira qualidade e o cantor mais popular do país no final dos anos 60. A expressão "patropi", para designar o Brasil, foi cunhada por Simonal em seu estilo próprio de cantar a música "País Tropical", de Jorge Ben.