Desembargadores mobilizados para manter salário acima do teto

segunda-feira, 10 de julho de 2006 às 07:54

São Paulo, 10/07/2006 - Salários excepcionais da toga, que ultrapassam em muito o teto de R$ 24,5 mil que a Emenda 41/03 fixou para os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), são o mais novo desafio do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Indignados com os limites e as regras impostos pela Resolução 13, que o CNJ quer ver cumprida este mês, desembargadores estaduais preparam ofensiva no STF - instância máxima do Judiciário -, a fim de preservar seus holerites que, em muitos casos, batem na casa dos R$ 35 mil.

O CNJ concluiu mapeamento dos contracheques da toga e fez descobertas que impressionam seus conselheiros. Salários construídos à custa de benefícios que incluem pagamento de adicionais por tempo de serviço (72% a mais sobre o salário, embora o limite autorizado pela Lei Orgânica da Magistratura seja de 35%) e vantagens - assim rotuladas pelas próprias cortes que as adotaram - de “pé na cova” (15% a mais para os que permanecem na ativa, mesmo com tempo para se aposentar) e “cascatinha” (gratificação adicional de 25%).

O CNJ identificou nos Estados cerca de 30 penduricalhos que elevam vencimentos da toga a um patamar inacessível ao resto do funcionalismo.

Juízes ganham ajuda de custo, sexta-parte (incorporação de 1/6 sobre os vencimentos quando completam 20 anos de serviço), triênios (6% a cada 3 anos), auxílio-moradia (30%), gratificação de presidente (até 50% em alguns tribunais), verba de representação, diárias, adicional trintenário (10% após 30 anos de serviço), indenização de férias não gozadas e auxílio funeral.

A folha salarial dos magistrados pesa bastante, em geral consome de 85% a 90% do orçamento da corte. Com base nesse rastreamento, o CNJ editou a norma que inquieta magistrados. “Um estudo aprofundado e criterioso dá sustentação à resolução”, disse um conselheiro.

São dois os argumentos dos magistrados que se insurgem contra a ameaça a seus ganhos: o princípio constitucional da irredutibilidade de vencimentos e o direito adquirido. Os desembargadores, muitos com 35 anos de carreira, não admitem a pecha de marajás. Alegam que seus holerites são o resultado de muito trabalho, dedicação e têm amparo em leis. Sustentam que o corte em seus subsídios será uma afronta à Carta.

O primeiro ato da mobilização da toga ocorreu há duas semanas, quando dirigentes de tribunais estaduais bateram à porta da ministra Ellen Gracie. Ela acumula a presidência do Supremo e a do CNJ. Os magistrados não foram acintosos, mas expuseram sua preocupação e ressaltaram que a Constituição lhes dá guarida.

Um conselheiro do CNJ condenou a edição de leis estaduais que contribuem para ampliar os vencimentos de juízes. “A Resolução 13 é um trabalho de interesse público em um país de tantos miseráveis. Os magistrados devem ter uma remuneração digna, mas não um escárnio.”

Amazonas e Minas, os que pagam mais

Planilha encaminhada por 22 dos 27 tribunais estaduais ao CNJ, com dados atualizados até agosto de 2005, mostra que o menor salário de desembargador é em Goiás (R$ 12, 7 mil). O maior é no Amazonas (R$ 26,2 mil), seguido por Minas (R$ 25,7 mil) e Mato Grosso do Sul (R$ 25,3 mil).

As informações estão sob verificação do conselho porque em muitos Estados continuam sendo aplicadas gratificações extraordinárias, algumas de caráter permanente, outras transitórias, que engordam em até 50% o contracheque de desembargadores. O CNJ estuda sanções aos dirigentes de tribunais que não acatarem a resolução. Eles poderão ser enquadrados por improbidade.

O CNJ identificou tribunais que até recentemente pagavam 10% de adicional por tempo de serviço (a cada 5 anos) e a sexta-parte, vantagens que a Lei Orgânica da Magistratura (Loman) não contempla. Alguns tribunais, sob tensão, revogaram benefícios às pressas que, no entanto, foram incorporados por quem já os recebia.

Para neutralizar o motim da toga - e sua tese sobre direito adquirido e irredutibilidade de vencimentos -, conselheiros do CNJ invocam o artigo 65 da Lei Complementar 35/79 (Loman) e a Constituição, que vedam privilégios, e decisões já tomadas pelo STF. Para o Supremo,“a remuneração do agente público tem vocação de subsistência e não de capitalização”.

A Resolução 13, que dispõe sobre a aplicação do limite remuneratório constitucional e do subteto mensal aos magistrados, define que nos órgãos estaduais do Judiciário o teto é o valor do subsídio de desembargador, que não pode exceder a 90,25% do subsídio mensal de ministro do STF. Os desembargadores estaduais não podem ganhar acima de R$ 22,5 mil.

O subsídio mensal dos juízes é constituído exclusivamente de parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie de benefício, de qualquer origem. Ficam excluídas verbas de caráter indenizatório, ajuda de custo para mudança e transporte, auxílio-moradia e funeral, diárias.

Vários tribunais não abrem mão das vantagens. Pagam bem mais amparados em leis estaduais - algumas da década de 50, ainda em plena vigência - que afrontam a palavra final do Supremo. A reportagem é de autoria do jornalista Fausto Macedo e foi publicada na edição de hoje do Estado de S. Paulo.