Diploma de gaveta: mais profissões correm risco de perder regulamentação
São Paulo, 29/07/2009 - Formação cultural sólida, domínio do português, senso ético e fidelidade aos fatos. Para o ministro do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, o jornalista só precisa disso, e mais nada. O diploma é dispensável. A decisão do STF, de derrubar a necessidade do diploma para ser jornalista, levantou dúvidas na sociedade e gerou polêmica. À imprensa, o ministro Gilmar Mendes afirmou que a queda da exigência do diploma de jornalismo criará uma espécie de modelo de desregulamentação para outras profissões.
Heitor Kuser, presidente do IBDES (Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Econômico e Social), explica que a Constituição Federal de 1988 prevê a regulamentação de profissões que podem oferecer riscos à saúde, ao bem-estar ou à segurança da população, o que poderia justificar a desregulamentação de mais profissões.
Segundo ele, existe um debate atual acerca da necessidade de diploma para ser economista, professor de educação física, entre outras atividades. "Gilmar Mendes avisou que outras profissões serão desregulamentadas", lembrou.
No caso específico do jornalismo, ele desaprova a decisão e acredita que a população saiu perdendo no que se refere à ética e à imparcialidade exigidas pela atividade de repórter. "Já existem pessoas sem diploma de jornalista expressando suas opiniões na imprensa. São os articulistas e comentaristas", afirma.
"O jornalista tem a capacidade de traduzir informações de forma que todos compreendam, do trabalhador com menos estudo ao presidente da República. Acho que o País perderá no que tange à função principal do jornalista: democratizar a informação", opina.
"Para ser repórter ou editor, é preciso ter a técnica. Esses ministros não sabem o que é um conselho editorial ou uma pauta e cometeram um erro grave. Creio que as grandes editoras continuarão preferindo profissionais formados. É o mesmo caso do analista de sistemas. Não é uma profissão regulamentada, porém 90% das pessoas que trabalham na área têm diploma para tal. Isso acontece porque a chance de esse profissional cometer um erro grave é menor e empresa nenhuma quer assumir grandes riscos". De acordo com Kuser, o problema se dará em rádios e jornais do interior, onde, não raro, os jornalistas são membros da família do proprietário, ou amigos. Falta profissionalização e esse quadro pode piorar.
Ophir Cavalcante Junior, diretor do Conselho Federal da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e advogado trabalhista, explica que a regulamentação das profissões, no geral, é necessária. "A sociedade não pode ficar ao sabor de conveniências políticas. Nossos profissionais são treinados justamente para melhor servir à sociedade. A desregulamentação das profissões favorece a proletarização das mesmas".
Ele lembra que a decisão do STF, que começou com o jornalismo e pode se estender a outras profissões, irá desestimular os jovens a cursarem uma faculdade, embora obrigue as instituições de ensino a perseguirem um maior nível de qualidade.
Por fim, o diretor da OAB afirma que a decisão pode acirrar a disputa por leitores entre sites de notícias oficiais e páginas pessoais e blogs, já que a não-obrigatoriedade dos diplomas pode legitimar estes últimos. "A internet é um canal livre, por meio do qual todos podem se expressar (possuindo ou não diploma)", lembra. (A reportagem é de autoria de Karin Sato e foi publicada na edição de hoje do portal Info Money).