Advocacia e cidadania sertanejas permeiam conferência do II Encontro
Juazeiro (BA) – O tema que abriu o último dia do II Encontro Nacional dos Advogados do Sertão, nesta sexta-feira (1º), tratou do exercício da advocacia e da cidadania nos sertões do Brasil. Cezar Britto, membro honorário vitalício da OAB, foi o conferencista.
“Para falar de cidadania nos tempos atuais, precisamos considerar que muitas máscaras vêm caindo”, introduziu. “As pessoas hoje se apresentam sem a roupagem civilizatória que antes era um padrão. Se elas têm ódio, reproduzirão esse ódio; se são homofóbicas, reproduzirão esse preconceito. Pelo menos parecem estar mais transparentes”, completou.
Para Britto, a tecnologia, que deveria ter trazido a inclusão, trouxe exclusão em muitos sentidos. “A tecnologia, inclusive, é forte propulsora dos comportamentos excludentes. Publica-se e repassa-se o que bem se entende, sem checar veracidade, somente por pensar de forma oposta. Se não gosto, tudo é permitido. Não, este não é um comportamento cidadão”, criticou.
Ele ressaltou a importância do direito de opinião e condenou a falta de liberdade. “O direito de opinião é um dos maiores pilares da nossa Constituição. Mas há um processo de criminalização das opiniões. Não se pode ser coxinha, ou petralha, ou mortadela, ou o que quer que seja. É preocupante não poder assumir um pensamento sob pena de achaques cotidianos”, lamentou.
Por várias vezes em seu discurso, Britto lembrou Sobral Pinto. “Ele dizia que a advocacia não é profissão para covardes. E tinha total razão, ontem, hoje e sempre. A nossa Constituição, diferentemente de muitas no mundo, menciona por diversas vezes a advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil. Nos dá legitimidade, missão e identidade. Defender o cidadão é lutar por justiça, sem jamais pensar em fazê-la pelas próprias mãos. Num país desigual, de cultura patrimonialista e colonialista, fica realçada nossa missão de buscar justiça. Doa a quem doer, não importa se soe impopular à opinião pública”, cravou.
“A advocacia tem um papel fundamental de resistência. É difícil dizer ao poder público o que ele não pode fazer. É difícil que o Estado entenda seus próprios limites legais. Existimos para isso, a defesa é o nosso viver e o nosso respirar. Sem coragem, o advogado não existe”, completou.
Ele classificou como impressionante o preconceito contra o interior. “Principalmente contra sertanejos. Já chegaram pessoas para me parabenizar, após palestras, dizendo que não sabiam que existiam advogados inteligentes no Nordeste. Eu já fui achincalhado várias vezes e sei exatamente o que é ser vítima de autoritarismo travestido de autoridade, de preconceito travestido de respeito às diferenças”, disse.
“Mas não quero aqui trazer desesperança”, apontou. “Os tempos das máscaras caídas são tempos difíceis, sobretudo ao advogado militante no interior, mas nossa missão é vencê-los. Sou um otimista, entendo que as pessoas têm cada vez mais se apresentado com seu rosto real. Eu sabendo quem meu adversário é, posso enfrentá-lo com mais respeito e qualidade. Vamos à luta”, concluiu.