OAB encerra webinar com debates sobre fake news nas redes sociais e eleições
O terceiro e último dia do Webinar Fake News, Caixa Dois e Corrupção: Diálogos entre Direito Eleitoral e Penal, realizado nesta quarta-feira (24), foi conduzido pela apresentação e pelo debate de especialistas em direito eleitoral sobre o impacto das fake news nas eleições. O encerramento do evento contou ainda com a participação do ministro Luís Felipe Salomão, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que tratou sobre as ações adotadas pela Justiça Eleitoral no combate às notícias falsas.
No último painel do evento quatro especialistas debateram sobre o impacto das fake news nas eleições. A conselheira federal Geórgia Nunes falou que o principal obstáculo dos operadores do direito eleitoral na era digital é pensar formas de identificar os responsáveis e comprovar a prática de fake news, garantindo punição e a reparação de danos.
“Ao mesmo tempo em que reconhecemos os inúmeros benefícios das novas tecnologias utilizadas em prol da comunicação, como as redes sociais, é também necessário destacar as ameaças à democracia trazidas com a incontrolável disseminação de informações falsas e ofensivas nas plataformas digitais. As chamadas fake news têm sido utilizadas para alimentar o ódio, o radicalismo e o divisionismo na sociedade, com a propagação massiva de mentiras, que são responsáveis por 70% de todo o conteúdo compartilhado nas redes. Como inibir, identificar os responsáveis e comprovar a prática das fake news, para permitir a necessária punição e reparação do dano, são os principais desafios dos operadores do direito na era digital”, afirmou Geórgia Nunes.
Já a Conselheira Federal Luciana Nepomuceno explicou o conceito de fake news. Ela afirmou ser fundamental entender que a utilização das notícias falsas ocorre de forma dolosa, com intenção de prejudicar uma pessoa ou de tentar manipular o resultado de uma eleição.
“Embora a tradução literal seja a de notícia falsa, essa expressão vai além do que é verdade e mentira. A melhor tradução seria a de notícia fraudulenta, porque posso ter uma notícia verdadeira que seja descaracterizada ou colocada em um contexto falso, com o propósito de enganar. Temos aqui um ponto fundamental, o elemento subjetivo do dolo, que essa notícia fraudulenta cause um dano, faço essa ressalva exatamente em um momento em que se pensa em criminalizar a conduta. Isso ajuda a entender que as notícias falsas não se restringem ao ciberespaço, embora encontrem no terreno da internet o seu espaço mais fértil, de fácil e rápida disseminação”, avaliou Luciana Nepomuceno.
A secretária-geral do TSE, Aline Osório, destacou que as fake news não são um fenômeno recente. Entretanto, diante de um novo “ecossistema”, em que a disseminação ocorre de maneira exponencial, é preciso mudar as formas de combate, mas ao mesmo tempo preservar direitos fundamentais, como a liberdade de expressão.
“As fake news sempre existiram e não há muito o que fazer para garantir a correção de toda a informação que circula. O que mudou nessa realidade de antes e agora é o ecossistema da mídia, a forma como as pessoas se informam e a forma que a informação circula. Temos fenômenos como robôs, contas falsas e até mesmo empresas que foram formadas para disseminar informação falsa. A própria Justiça Eleitoral foi alvo em 2018. Não existe uma solução mágica e a Justiça Eleitoral não vai vencer essa guerra. Todas as formas de combate precisam ainda garantir a liberdade de expressão. Temos várias soluções que podem ser utilizadas, como o uso de robôs do bem, agências de checagem e oferecer educação digital para a população”, disse Aline Osório.
Por fim, Luiz Fernando Pereira, presidente do Congresso Brasileiro de Direito Eleitoral, tratou dos aspectos processuais para se combater as fake news. Ele lembrou que antes do novo “ecossistema” gerado pela internet, a Justiça Eleitoral até possuía técnicas processuais para esse combate, como ações de busca e apreensão, retirada de conteúdo do ar em rádio e TV e o direito de resposta, mas agora essas ações poucos surtem efeito.
“O novo ecossistema desorganizou as técnicas que estão à disposição para o combate. Precisamos reconhecer que o processo de reserva de jurisdição não dá conta. Reconhecendo isso, temos que adotar um modelo de autorregulação, como contar com um consórcio de empresas de comunicação, exemplo do México, ou algo que possa fornecer respostas de forma mais rápida. Destaco ainda que isso não significa que a autorregulação está imune ao controle judicial. Se ela for feita de maneira ruim, podemos ainda acionar o Judiciário. É preciso um sistema híbrido, que seja mais rápido, para respondermos ao desafio”, falou Luiz Fernando Pereira.
Encerramento
Na cerimônia de encerramento, além do ministro Luís Felipe Salomão, participaram a presidente do IAB, Rita Cortez, e o vice-presidente da OAB Nacional, Luiz Viana, com a mediação do desembargador do TRE-RJ Gustavo Teixeira. O ministro do TSE destacou as ações realizadas pela Justiça Eleitoral nos últimos anos e falou ainda sobre qual vem sendo a posição adotada pelo TSE na análise dos casos de fake news.
“A Justiça Eleitoral não deve atrair para si a função de “fact-checking” ou ainda realizar um controle excessivo. É nessa linha que o presidente do TSE tem se pronunciado e é essa a linha que temos adotado quando analisamos as representações nas últimas eleições. Controle sobre conteúdos deve ser realizado pela própria sociedade civil. O nosso papel é preservar os principais pontos dos bens jurídicos tutelados pela Justiça Eleitoral, como a democracia, igualdade e a higidez do sufrágio. Não é o nosso papel checar a veracidade ou não das informações. Para isso temos que realizar os convênios com diversos órgãos e com a imprensa, além de trabalhar com campanhas de conscientização”, explicou Luís Felipe Salomão.
A presidente do IAB, Rita Cortez, disse que o evento gerou bastante repercussão e se mostrou preocupada com a velocidade de disseminação das notícias falsas. “Eu entendo que esse fenômeno de disseminação de notícias falsas não é uma coisa nova, mas a novidade agora fica por conta dos métodos de reprodução e propagação dessas notícias. É preocupante porque fake news podem colocar a democracia em risco”, disse.
Já o vice-presidente da OAB Nacional, Luiz Viana, disse que concorda com a posição de que a Justiça Eleitoral não vai conseguir vencer essa guerra sozinha. “Pelo viés da propaganda ilícita, os candidatos fazem contas de quanto serão as multas, mas no momento em que a Justiça Eleitoral começar a dizer que é abuso de poder, passível de cassação do registro, do diploma ou do mandato, teremos a possibilidade de efetiva contenção das fake news. Precisamos incentivar que todos possam contribuir para evitar as fake news, mas partidos e candidatos precisam saber que a mão pesada da Justiça Eleitoral poderá alcançá-los, cassando mandatos e diplomas”, encerrou Viana.